LIVE NIRVANA INTERVIEW ARCHIVE January 13, 1993 - Seattle, WA, US

Interviewer(s)
Pedro Só
Interviewee(s)
Krist Novoselic
Publisher Title Transcript
Jornal Do Brasil Baixista do Nirvana falará contra cigarros no Hollywood Rock Yes (Português)
Programa Ping-Pong Yes (Português)

Baixista do Nirvana falará contra cigarros no Hollywood Rock

O Nirvana está preparando uma peça para os organizadores do Hollywood Rock. Em entrevista por telefone, de Seattle, Chris Novoselic, baixista do grupo mais incensado da atualidade, ficou sabendo pelo Jornal Do Brasil que o festival era patrocinado por uma multinacional de cigarros e avisou que vai fazer algo contra o tabagismo no palco. Apesar de procurada, a Souza Cruz, até o final da tarde de ontem, ainda não haviam se manifestado.

Nascido na Croácia, Novoselic foi morar na pequena cidade de Aberden, interior do estado de Washington, ainda garoto. Lá, junto com o colega de escola Kurt Cobain, fundou o Nirvana em 1987. Cobain, teoricamente o líder do grupo, não é de conversa durante os shows. Quem costuma intervir, geralmente com bom humor, é o grandalhão Novoselic, o mais articulado da banda. Abaixo, ele fala sobre o novo disco, conta que se colega anda ouvindo os Mutantes e revela seus planos para depois dos shows no Brasil: visitar a terra natal e ver com os próprios olhos a terrível situação dos campos de refugiados.

JB: Como vão os trabalhos para o novo álbum?

KN: As canções já estão terminadas, porém, não gravamos nada. Temos apenas ensaiado. Talvez a gente toque algumas delas aí, mas a base do repertório vai sair mesmo dos discos Nevermind e Bleach. Um pouco depois de voltar do Brasil, entramos em estúdio. Provavelmente vamos gravar em 24 canais mesmo. Ainda estamos escolhendo o produtor. Não gostaria de citar nomes, por respeito aos caras que forem preteridos. O disco deve ser mais ou menos como Nevermind, uma mistura entre rock e canções melódicas, com menos produção.

JB: Vocês já ouviram alguma banda brasileira?

KN: Kurt falou comigo ontem à noite sobre uma fita de um grupo brasileiro que um conhecido lhe havia dado. Eles são do fim dos anos 60, psicodélicos e meio malucos. O nome começava com a letra m... Soa familiar para você?

JB: Por acaso não seriam os Mutantes?

KN: Isso mesmo, The Mutants!

JB: Na música “In Bloom”, Kurt fala dos caras violentos e reacionários que conhecem todas as músicas legais de cor, mas não tem a menor ideia a respeito do que as letras dizem. O que você acha de tocar para uma plateia onde seguramente 90% das pessoas não sabe o que Kurt canta?

KN: Isso é um fenômeno geral. Não creio que muita gente entenda o Nirvana. Para a maioria, somos só mais uma banda grunge. E nós nunca quisemos que nos associassem a toda essa história de grunge.

JB: Na sua opinião, o que é grunge?

KN: (suspiro) É um rótulo comercial novo para bandas baseadas em sons de guitarra, meio hard rock.

JB: O festival onde o Nirvana vai tocar é patrocinado por uma grande multinacional de cigarros. Vocês tem alguma restrição quanto a este tipo de evento?

KN: É mesmo? Qual companhia?

JB: British American Tobacco.

KN: Ninguém tinha nos dito nada sobre isso. Bem, se as pessoas querem fumar, é uma prerrogativa delas. Mas acho que vou falar alguma coisa no palco. Cigarros são terríveis. O tabaco é tratado com muitas substâncias químicas, até os filtros tem fibra de vidro e fazem mal. De vez em quando eu fumo, só que não desses cigarros industrializados. Mas as pessoas não estão nem aí, se enchem de Coca-Cola e Pepsi, que são verdadeiros venenos e causam câncer... Acho que vou falar alguma coisa também sobre isso no palco.

JB: O que achou do show que vocês fizeram na Argentina?

KN: Foi muito ruim. Tocamos mal, sem entusiasmo. Era como se a gente não estivesse ali.

JB: Isto teve alguma coisa a ver com o fato de a plateia ter praticamente expulsado a banda Calamity Jane, que vocês trouxeram como atração de abertura?

KN: Sim. Aquilo foi um pouco perturbador.

JB: Como você e Dave se dão com Courtney Love (mulher de Kurt Cobain)? Dizem que ela estaria separando vocês de Kurt e colaborando para o fim do grupo, mais ou menos como Yoko fez com os Beatles...

KN: Durante um certo tempo toda a pressão sobre a gente pesou um pouco. Mas somos grandes amigos, passamos o Natal juntos, nos falamos sempre... Na verdade, esta história de Courtney/Yoko é boa. A história dos três rapazes de uma cidade pequena que viraram sucesso repentinamente ficou velha e o pessoal tinha que inventar outra (risos).

JB: É verdade que vocês só participaram na festa de entrega da MTV Awards porque houve uma espécie de chantagem? Caso não tocassem, eles não passariam mais seus vídeos?

KN: Foi uma ameaça sutil. Eles tem métodos formidáveis para persuasão.

JB: É verdade que vocês não tocam mais “Smells Like Teen Spirit”?

KN: Não, talvez a gente toque. Esta música é meio esquisita para nós, criou-se um estigma em torno dela. Vamos discutir e decidir.

JB: O que você acha do elenco internacional do Festival (Red Hot Chilli Peppers, L7, Alice In Chains, Simply Red e Maxi Priest)?

KN: Odeio todas essas bandas.

JB: Não livra nem o L7?

KN: (risos) Não, eu só estava brincando. Sei lá, a gente só vai fumar e se largar na praia. Só vamos tocar pelo dinheiro. Falando sério.

JB: Você está rico?

KN: Sim! Mas não muito. Não podre de rico. Daqui a dez anos, devo estar duro de novo e talvez tenha que arranjar um emprego por aí.

JB: Você nasceu na Croácia, atualmente envolvida em sérios conflitos. Tem vontade de fazer algo pela sua terra?

KN: Estou indo para lá direto depois da estadia no Brasil. Tinha planos de ir entre o show de São Paulo e o do Rio, mas corria o risco de ficar preso e não conseguir voltar a tempo. Todos estes governos estão sentados assistindo atrocidades acontecerem. Ninguém faz nada. A cada dia a TV mostra coisas horríveis, mas parece que as pessoas já estão acostumadas a ver este tipo de coisa nos filmes do Schwarzenegger. Eu podia falar horas e horas, sair na rua com uma bandeira, gritar por aí, mas não adiantaria. Eu me sinto responsável. Vou aos campos de refugiados. Depois pretendo ao menos escrever um artigo para uma revista americana.

© Pedro Só, 1993

O baixista Chris Novoselic, do Nirvana, falou à Programa por telefone, pouco antes de embarcar rumo ao Hollywood Rock.

Programa: Como foi a seleção das músicas para o álbum Incesticide? O lançamento foi uma iniciativa sua ou da gravadora?

Novoselic: Foi ideia da gravadora, mas a gente gostou e escolheu as faixas. Quer dizer, na verdade elas eram praticamente tudo o que tínhamos.

Programa: O que você pretende fazer no Brasil além de tocar?

Novoselic: Estou ansioso para me deitar na praia. Talvez eu de uma saídas para tentar descobrir lugares interessantes por aí. Mas basicamente quero relaxar e pegar sol. Em Seattle está fazendo um frio danado. A temperatura está abaixo de zero.

Programa: Qual a verdadeira história do guitarrista Jason Everman na banda? Ele não participou de Bleach, primeiro disco, mas seu nome consta nos créditos ...

Novoselic: Jason tocou conosco durante cinco meses, fez vários shows, mas não chegou a participar de Bleach. Ele pensava totalmente diferente da gente, tinha outro estilo de vida e acabou saindo.

© Pedro Só, 1993